PERFEIÇÃO vs PERCEPÇÃO

Cristina Pagnoncelli
5 min readOct 27, 2020

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O que é ser (ou tornar-se) uma mulher?

Afinal, o que define uma mulher? O que representa o feminino? Não é de hoje que nos deparamos com uma imensa lista de expectativas e idealizações do que “deve ser” uma bela e desejada mulher, uma mãe perfeita e amorosa, uma esposa exemplar, uma filha recatada e do lar…

Registro de processos criativos e detalhes da pintura.

Diante da temática “o que é o feminino” proposta no convite para participar da primeira ação do Coletivo Muchas Minas “em casa” em parceria com as Tintas Vergínia, logo pensei no quanto, nós, mulheres somos constantemente vigiadas e controladas em relação à tudo –beleza, inteligência, desempenho profissional, roupas, comportamento, etc– mas principalmente em relação à nossa aparência e apresentação, mesmo que sutilmente.

Não à toa, hoje, o Brasil é o país que mais realiza procedimentos estéticos e cirurgias plásticas no mundo… NO MUNDO! O desejo pelo rosto perfeito*, corpo magro e definido, pele impecável, extinção de pêlos, peitos durinhos e grandes (da-lhe silicone!), barriga chapada (mete lipo nessa gordura!), zero celulite (vai fazer dieta, malhar, regular hormônios!)… a obsessão pela beleza é doentia e está destruindo as mulheres.

Na mesma época, me deparei com a frase escrita por um amigo, Greg Carniel: “Perfection is a perception” e que me levou a pensar no quanto a percepção da perfeição é construída na nossa cabeça, diante de tudo que aprendemos e assumimos como verdadeiro – e também do que (não) questionamos. Afinal, o que (e quem) define o que é perfeito?

Decidi trabalhar essas duas palavras que coincidentemente são quase idênticas. Para a palavra PERFECTION desenhei uma type mais ‘dura e linear’, como um padrão, uma prisão (grades). Fiz um paralelo com a magreza feminina sendo exposta como ideal de beleza há anos, sempre nos colocando em caixinhas e incentivando as mulheres a buscar a todo custo encaixar-se nesse modelo (no qual, mesmo já sendo magras, parecemos nunca ser o bastante ou suficientemente bonitas — outra vez, pergunto: pra quê? pra quem?).

Para a palavra PERCEPTION, me inspirei na técnica de marbling. E essa solução (insight) veio no meio do processo, enquanto misturava tintas para chegar numa terceira cor. Vi aqueles tons mesclados e pensei no quanto visualmente aquilo poderia representar a nossa jornada única e individual de experiências pessoais, absorvendo conteúdos, adicionando vivências, formando nossos pensamentos e opiniões ao longo da vida. Um mix de tudo que lemos, ouvimos, vivemos e que por fim acabam nos transformando.

Inspiração na técnica de ‘marbling’

A percepção é fluída, é orgânica e individual, mas principalmente, ela é (des)construída. Não possui forma específica, não existe regra. Foi pensando nisso que trabalhei um lettering camuflado se moldando às formas do pattern (textura) de fundo. Reforçando a ideia de que a perfeição está (ou não) nos olhos de quem vê.

Enquanto pintava, refleti também sobre minhas próprias expectativas em relação ao que estava criando, na exigência do traço perfeito, no quanto sempre me cobro por entregar o melhor, muitas vezes me tirando o sono e a tranquilidade. Alternando com momentos de euforia e realização.

esse meme!!! hahahaha (tradução: apenas duas emoções quando você é um artista)

Noto durante o processo que são todas percepções só minhas, uma mescla de autocríticas, cobranças, expectativas pessoais (também influenciadas pelo mundo externo) e, na maioria das vezes, apenas construções da minha própria mente; pensamentos que geram sentimentos: medos, angústias, frustrações… porém observo e busco acolher todas essas emoções que também podem ser transformadas em aceitação, perdão, aprendizado…

Por fim, acredito que é esse o principal dom da energia feminina: a sensibilidade, a intuição, o sentimento junto da reflexão profunda (e constante racionalização) sobre as questões da vida. Trabalhar o nosso feminino é permitir-se sentir e observar as nossas emoções – de onde elas vem, pra onde vão; e como moldam quem somos hoje.

Vejo o feminino como essa força transformadora, resiliente e inspiradora, que é capaz de curar, de fazer da dor perdão, transmutar ódio em amor, frustração em superação, medo em coragem... A energia feminina é poderosa e acolhedora e está em todos nós, independente de gêneros.

E aí, como você tem trabalhado o seu lado feminino?

Mural finalizado no meu quarto
Os detalhes em dourado são minha parte preferida, ao vivo, ficou ainda mais lindo ❤

Como de costume, aproveito pra deixar algumas dicas de leituras ou documentários sobre os assuntos abordados:
– O mito da beleza (livro)
– A política sexual da carne (livro)
– Sejamos todos feministas (livro)
– Como educar crianças no feminismo (livro)
– The Mask You Live In (documentário)
– Innsaei: O Poder da Intuição (documentário)
– Savage X Fenty Show Vol. 2, desfile da Rihanna

Agradecimento especial à artista de marbling de Curitiba que tive aula e contato com a técnica de pertinho, e que admiro muito: Ana Paula Luz

Deixo também, esse link para uma de minhas listas no Spotify que chamo de “feminine energy” — com muitos sons e mulheres incríveis pra te inspirar!

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Cristina Pagnoncelli
Cristina Pagnoncelli

Written by Cristina Pagnoncelli

Designer e artista visual. Profissional autônoma e professora da Oficina de Lettering com Giz. Busca através do design comunicar, questionar e transformar.

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